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quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Lutando por uma educação física inclusiva nas escolas

Rede SACI
04/01/2011

Rosangela Gera expõe suas ideias e leituras acerca do tema com base na experiência de sua filha com deficiência visual em idade escolar

Comentário SACITexto enviado no final de 2010 a um fórum de discussão sobre inclusão, do qual a Rede SACI participa.
Rosangela Gera
Oi pessoal, todos acompanharam aqui na lista alguns comentários meus sobre a participação da Laura nas aulas de educação física (aluna com deficiência visual, 8 anos, do ensino fundamental I) durante esse ano, posso dizer que da discussão que iniciei na escola, não houve mudança significativa, no sentido de que as reflexões não foram aprofundadas, apenas foi feita uma maquiagem para que a participação da Laura fosse mais efetiva, porém foram altos e baixos, volta e meia conversava com coordenador, professor, e os depoimentos da Laura se alternavam entre "hoje foi bom" e "eles não passam a bola pra mim porque sabem que eu sou cega e não vou acertar", ou "quando outra pessoa pega a bola todo mundo grita, quando eu pego ninguém fala nada porque eu sempre erro".
Vejo a educação física como uma disciplina tão importante quanto as demais e preocupa-me em especial a questão da auto estima, esse sentimento de estar lá mas não fazer parte, que tenho certeza deve ser vivida por muitas crianças com ou sem deficiência que por algum motivo não se identificam com certas aulas de educação física. Passei grande parte desse ano fazendo leitura sobre o assunto, descobri a proposta dos jogos cooperativos e me aprofundei em conhecimentos sobre a educação física na perspectiva da educação inclusiva, e a escola (pelo menos a da minha filha) precisa rever a sua prática de educação física.
No último dia de aula, sexta -feira passada, doei à escola os livros que fizeram parte desse estudo junto com uma carta a qual estou compartilhando com vocês e que enviarei a alguns pais e mães por e-mail para que juntos possamos cobrar da escola uma mudança de postura na questão dessa disciplina em particular, porque considero a partir do depoimento das próprias colegas da Laura, crianças sem deficiência, que queimada e outros jogos similares ninguém aguenta mais. Aqueles que tiverem sugestões, experiências, opiniões que possam compartilhar comigo sobre o assunto, agradecerei se me enviarem pois enriquecerá essa discussão com a escola.
Um abraço a todos e fiquem com a carta:
Coordenação Pedagógica / e Coordenação Educação Física Ensino Fundamental:
A leitura desse material me trouxe muitas informações que gostaria de compartilhar com os profissionais envolvidos com a educação física da escola. Por favor, não me levem a mal, ou vejam como pretensiosa a minha intenção, apenas pensem no meu papel de mãe, inquieta, dedicada e apaixonada pela educação inclusiva.
Penso na educação física como uma disciplina de grande importância curricular, que propicia aos alunos momentos de alegria, diversão, prazer, reforça vínculos afetivos, sociais, que os retira um pouco daquele ambiente sério de transmissão de conteúdos da sala de aula, para um ambiente de descontração e relaxamento tão importantes para o aprendizado. Mas, é no desenvolvimento da auto-estima do aluno que considero a sua contribuição fundamental e também perigosa . E é por isso que a esse estudo me dediquei.
Nessa leitura que fiz descobri que até o ano de 1980 era comum no Brasil as escolas se esforçarem no treinamento dos estudantes para que esses trouxessem troféus às mesmas. Após esse período a prática da educação física foi incorporando outros valores e esses campeonatos deixaram de ser o objetivo da disciplina. Também li que nos últimos 10 anos, a educação física foi a disciplina do ensino fundamental que mais passou por alterações.
Foi então, buscando a aplicação da prática da educação física escolar na perspectiva da educação inclusiva que iniciei uma “mini-pesquisa“ sobre o assunto. Porque a teoria já conhecemos, todos sabem sobre a legislação, mas de fato incluir todos os alunos em todas as aulas não é tarefa fácil, descobri que é preciso informação e planejamento. E foi buscando informação que, continuando a falar sobre a leitura que fiz, descobri professores de educação física escrevendo, estudando e desenvolvendo a prática de jogos cooperativos. Estes jogos não foram incorporados por causa da educação inclusiva, mas a ela se aplicam perfeitamente , porque não buscam competição, a seleção dos mais habilidosos, buscam cooperação, o prazer do jogo em jogar e não em vencer, o que implica necessariamente em derrotar outro, que sempre será considerado o mais fraco.
Preocupa-me então essa seleção que os jogos convencionais promovem entre os estudantes em aulas de educação física, a história de ser café com leite, de ser ou se sentir excluído, e de consequentemente ter afetada a auto-estima. Mas, será que jogar sem competir tem graça? Ou será que a pergunta mais apropriada seria: Porque só tem graça se tivermos que derrotar o outro? Em uma das referências um autor diz: ”A escola deveria ensinar os alunos a serem competentes em vez de serem competitivos.” E outro falou: “O jogo que ensinamos na escola é o jogo que será jogado na vida “. “Ensinar os alunos a serem cooperativos é uma tentativa de melhorar a nossa sociedade.“ Eles também citaram que o stress, e a ansiedade em uma partida competitiva, tira o prazer e o relaxamento que o jogar proporciona, porque o objetivo é ganhar do outro, e o jogo em si é jogado para se chegar ao final dele.
Enfim, acho que essa discussão é muito mais ampla do que a situação especifica da inclusão de alunos com deficiência nas aulas de educação física. Temos muito mais exclusões do que podemos imaginar, crianças que estão acima do peso, que são menos habilidosas, que têm vergonha de alguma parte do corpo, que lidam mal com as perdas, que são rotuladas a partir do seu desempenho em jogos, que simplesmente não se identificam com a prática de jogos, todas essas situações e tantas outras, são pertinentes a essa discussão, de maneira que trazer esse assunto à coordenação pedagógica, e à coordenação da disciplina em questão, me parece uma atitude apropriada.
Penso que levar esse assunto à comunidade escolar (pais e alunos) através de palestras com profissionais que têm alguma experiência sobre o tema(educação física na perspectiva da educação inclusiva), entre outras abordagens, é algo que poderia começar a operar as mudanças necessárias no modo de pensar sobre a educação física escolar em nosso meio.
Prezadas, gostaria de disponibilizar para os profissionais envolvidos com o tema a bibliografia em que fiz pesquisa. Espero como disse, apenas compartilhar essas informações, porque sem esse compartilhar nada poderemos produzir, criar, recriar, não é verdade?
E que essa leitura leve a reflexões.
E que a educação física possa fazer parte do repertório discutido nas reuniões pedagógicas com os pais. Por que não perguntar a eles, como seus filhos se sentem nessas aulas, qual a importância desse momento para eles? O que gostaria que fosse mudado? Ou não há nada para mudar? Qual o valor que os pais dão a essas aulas? Será que consideram sua importância? Ou estão todos, estamos todos nós apenas preocupados com os conhecimentos de provas de vestibular?
Todas nós vimos o tema do último vestibular da UFES: “Se você fosse radialista como convenceria seus ouvintes a terem uma alimentação saudável e não comerem carne?” Isso tem a ver com a educação física.
Enfim, tomara que esta iniciativa possa resultar em reflexões sobre o tema, e que a partir dela, possamos escola e família reconhecer, mais do que fazemos hoje, o valor dessa disciplina na vida de nossos filhos e alunos.
A todos, um abraço, e um 2011 de muita paz para todos,
Rosangela Gera.
Bibliografia:
Educação física adaptada - Vanja Ferreira
Educação física adaptada no Brasil - Rita de Fátima Silva
Educação física interdisciplinaridade, aprendizagem e inclusão - Vanja Ferreira
Trabalhando com jogos cooperativos - Marcos Miranda Correia
Brincando e aprendendo com jogos cooperativos - Reinaldo Soler
Educação física inclusiva na escola - Reinaldo Soler

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